Bocados de Ar

Porque as palavras não passam de bocados de ar

quinta-feira, julho 17, 2003

Domingo: um dia de tédio

Domingo. Acordo tarde. Leite com cookies de chocolate. Bom. Humor, até então, estável. Calor. Nível de bom-humor caindo vertiginosamente. Sozinha em casa. Todos viajando. Mais calor. Abro todas as janelas e a porta da varanda. Tiro a roupa. Ficar sozinha em casa tem dessas vantagens. Lembro que tenho que descer com o Fred. Visto uma roupa bem fresquinha, maldizendo o dia em que decidiram comprar um cachorro. Sim, decidiram. Eu era contra. Admito que, hoje em dia, sou louca pelo meu cachorro. Também admito que descer com ele me fez bem. Tomei um pouco de Sol. E Sol sempre melhora o meu humor. Cachorros demais lá embaixo. Depois dele fazer o que tem que fazer, decido subir. Não quero ser arrastada, quando o Fred decidir brincar com um dos pequenos puppies que também aproveitam o horário para levar seus donos para passear. Ao abrir o elevador, com quem me deparo? Com o vizinho que odeio. Marido da vizinha que odeio. Um casal de insuportáveis. Com insuportáveis filhotes, óbvio. Fecho a porta e espero que ele suba. Só então chamo novamente o elevador. Minha mãe diria que este foi um ato de grosseria. É, na TPM, eu fico sem-noção desse tanto mesmo. Aliás, grosseria coisa nenhuma. Ele merece esse tipo de tratamento. É repugnante. Não, não, repugnante não. Uma lesma é repugnante. Ele, certamente, é bem mais que isso. Entro em casa, tiro a roupa de novo. Calor infernal. Alimento o cachorro, o peixe, molho as plantas. Ponho uma lasanha congelada para assar. Aquilo tem gosto de tudo, menos de lasanha. Como. Fastio. Durmo de novo. Acordo daí meia hora e ligo a TV. Jogo de vôlei. Torço que nem uma louca pelo Brasil. Grito, pulo na cama, passo mal. Brasil ganha. Quero ver a entrega de medalhas, mas começa Faustão. Desligo a TV. É contra meus princípios assistir TV nos domingos à tarde. Mau-humor. Inchaço. Dor no peito. Óbvio, TPM. Dor-de-cabeça. Perna cansada. Tontura. Gravidez? Não, início de gripe mesmo. TPM+gripe+domingo à tarde. Isso não pode dar bom resultado. Sem Internet. Sem TV a cabo. Sem ninguém para conversar, ou ligar ou que me ligue. Tédio. Tento ler. Começo Babbit. Largo. Tento continuar Tom Sawyer. Largo. Pego até Os Maias. Tento uma redenção. Largo mesmo assim. Péssimo humor. Canino. Não é um bom dia para ler. Rolo na cama por quase uma hora quando resolvo ir contra meus princípios. Ligo mais uma vez a televisão. No Gugu, concurso “nova loira do tchan”, assim mesmo, tudo em minúsculas. Dez oxigenadas, seminuas e rebolativas. Vejo até a 5ª ou 6ª. Não suporto Gugu. Mudo de canal. Faustão. Cães-heróis. Adoro cães. Não suporto Faustão. Decido parar de me torturar e desligo a TV. Mais uma vez. Vou tomar um banho torcendo para que o domingo acabe. Escuto música, meu tio me liga. Dou umas risadas. Bom falar com alguém. Penso em ir ao cinema. Desisto quando penso que, além de ter que me vestir, ainda vou pegar uma fila gigantesca. Domingo: dia nacional da ida ao cinema. Espero o Fantástico, olhando para o nada, vendo os carros passando lá longe, na rua. Assisto um pedaço como biscoito com requeijão. Boto uma camisola de flanela e durmo cedo.
Minto. Não dormi tão cedo. Assisti àquele quadro “Grávidas”, com o Dráuzio Varella (ou Varela. Nunca lembro). Uma das mães deu à luz. A mãe chorou, o pai chorou, o Dráuzio chorou, eu chorei. Acho que todos que assistiam choraram. Todos, não. Sempre tem os insensíveis, que não vêm nada demais em um nascimento. E é o tipo de coisa inexplicável. Porque, a partir do momento em que temos que explicar porque choramos com a vinda de um bebê, perde o sentido. Não é algo que se entende, mas que se sente. Um nascimento merece lágrimas. Copiosas. Seja de quem for. Mesmo que não se conheça nem a mãe, nem o pai e nem o bebê. E quem não se comove com esse tipo de coisa é insensível. Ponto. Sim, ainda estou na TPM. Sim, na TPM sou o cúmulo da intransigência. E, não, não faço nada para mudar isso.
Enfim, conclusões, só duas:
- tivesse eu uma tendência à depressão uma pouco mais agressiva, teria cortado os pulsos com a faca de cozinha que usei para passar requeijão no biscoito. Em pleno domingo à tarde. Deixando milhares de órfãos.
- a TV brasileira É uma merda. Pelo menos, aos domingos. Ou, especialmente aos domingos.

É só. Mais um capítulo de “Meu Querido Diário...”