Bocados de Ar

Porque as palavras não passam de bocados de ar

sexta-feira, maio 02, 2003


Escrevi ontem, mas a maldita conexão não se sustentava. Então, posto só hoje:

Indignação

Tá. Estou indignada. Muito. Muito mesmo. Na verdade, não sei se "indignação" corresponde bem ao que eu estou sentindo. Não, não corresponde, mas não consigo achar outra coisa que expresse bem. Repúdio, talvez. Ojeriza. Horror. Podem escolher. Ou utilizar todas juntas. Mesmo assim não expressa bem o que eu sinto.
Enfim, por que tudo isso?
Por duas notícias que vi nos jornais televisivos nesta semana.
A primeira é sobre o número absurdo de pessoas que estão morrendo em Fortaleza por "falta de leitos na UTI". Todo dia a notícia é dada mais ou menos da seguinte forma: "morre mais uma pessoa por falta de leitos em Fortaleza". Eu escuto e não acredito. As pessoas estão morrendo como moscas e todos falam disso como se fosse uma coisa sem remédio. Como se estivesse fora de nosso alcance alterar este quadro. Como se fosse um fenômeno da Natureza, algo como um maremoto ou uma erupção vulcânica. Algo contra o que não podemos lutar, só nos cabendo olhar e fugir. É tão absurdo que as pessoas morram assim e ninguém realmente se manifeste e faça algo que eu não acredito. Cadê o Estado? Governador? Prefeito? Secretaria de Saúde? Diretor do Hospital? Sei lá, qualquer um.... Enfim, só consigo sacudir a cabeça...
A segunda notícia se refere aos tubarões que estão aparecendo no Rio de Janeiro. Não, não estou me indignando com os tubarões, mas com uma cena que eu assisti, um dia desses. Um tubarão se aproximou muito da praia. O biólogo que analisou a filmagem disse que possivelmente ele estava doente.
Uma turba de pessoas se aproximou desse animal. Exaltados, aos gritos, "Pega, Mata, Esfola", dignos das fogueiras de Salem, essas pessoas começaram a espancar o tubarão com os paus que tinham às mãos. Depois de tudo isso, arrastaram o peixe para fora do mar. Mesmo espancado e quase à morte, ele ainda tentou se defender, virando para trás e conseguindo morder, de leve, a perna de um dos "justiceiros". Arranhou um pouco e sangrou. As pessoas gritaram mais e bateram no tubarão até que, finalmente, ele morreu.
Tive tanta raiva desse povo que achei pouco a mordida que o tubarão deu. Deveria ter comido a perna do cara. Arrancado. Não só a do cara mas de as todos aqueles imbecis que se sentem no direito de matar um animal que não fez nada para eles. Sim, porque o grande crime cometido pelo tubarão foi se aproximar muito da praia. Praia = Mar. Mar = habitat natural dos tubarões e outros animais marinhos.
O tubarão vem nadando, em seu habitat natural, e é morto por pessoas ignorantes que acham o máximo matar um animal por ele ser tido como perigoso. Que acham que a única vida que deve ser respeitada é a de seres de sua espécie. Que todos os outros seres, vivos ou não, estão neste planeta com o fim, único e exclusivo, de lhes servir.
Ora, não querem encontrar um tubarão, não entrem na casa dele. É muito fácil matar um animal doente, em terra. Queria ver se esses asnos teriam toda essa coragem dentro do mar, lutando com um tubarão sadio. Aí, sim, eu queria ver. Para dar condições de luta, eu deixaria até que se levasse uma faca.
Não entendo as pessoas. Por que tanta raiva? Por que tanta violência? Os racionais, em princípio, somos nós. Cabe a nós evitar barbáries desse tipo. Cabe a nós respeitar a vida. Cabe a nós pensar. Ou não? Hoje em dia já entro em dúvidas. Você nunca vai ver nenhum animal matando outro por esporte. Para exibir como troféu....
Hffffffffffff, cansei. Sempre que penso muito nesse tipo de coisa, me canso. Me canso de gente.
Me canso de ser gente e ser da mesma espécie destes seres imbecis e egocêntricos que se sentem os reis do mundo e que não respeitam absolutamente nada nem ninguém que vá de encontro a eles...

Como diria Emília, do Sítio do Pica-pau Amarelo: Seres humanos. Passo.