Bocados de Ar

Porque as palavras não passam de bocados de ar

sexta-feira, setembro 27, 2002


É curioso observar que nem sempre as pessoas querem realmente uma resposta sincera quando perguntam algo. Eu já tinha observado isso, mas cada dia tem se tornado mais e mais constante passar por situações desse tipo. É provável que todos já tenham passado por isso (ou feito isso- eu já fiz), mas eu vou contar como sempre acontece comigo e tecer considerações psicológicas a respeito (psicologia de butequim, até porque eu não estudo psicologia).
É assim: eu faço algo que sei que, apesar de não agradar à uma outra pessoa, me agrada. Por me agradar, eu faço. Normalmente eu também sei que algo que fará o outro sofrer mas que, infelizmente, eu não posso fazer nada em relação a isso, porque é um sofrimento decorrente do ciúme ou da inveja e eu não vou me podar em função de sentimentos tão mesquinhos, que muitas vezes nem o próprio dono assume que tem. Mas, como eu não tenho coração de pedra, nem vou jogar na cara de terceiros a minha felicidade, eu não conto para a pessoa ou eu evito falar do assunto, mesmo que entre nós já esteja subentendido que eu fiz porque quis e que nada vai mudar isso.
Tudo está correndo aparentemente bem, quando a pessoa em questão se dirige a mim para me perguntar se eu fiz aquilo. É claro que ela sabe qual vai ser a resposta, mas no seu interior ela ainda acalenta a idéia, mesmo sabendo da impossibilidade de ela ser real, de eu dizer que não fiz e, por conseqüência, dizer que estou muito triste. Aí, ela vai poder me oferecer o ombro amigo, se compadecendo por mim, mas exultando por dentro, por ter estado certa por todo o tempo e por poder ver a minha derrocada. Mas o que acontece não é isso. Mesmo sabendo do fio de esperança que a pessoa tem quando da formulação da pergunta, eu não a engano e digo a verdade. Aí, normalmente a pessoa se chateia, porque eu só confirmei aquilo que ela já sabia que eu ia dizer, e eu acabei por matar a esperança em tudo ser como ela queria. É claro que essa "esperança" não é algo escancarado mas sim, escondido. Muitas vezes nem a prórpia pessoa reconhece a sua existência porque é parcialmente vergonhoso admitir que não se deseja a felicidade alheia. É o tipo de coisa socialmente reprovável, admitir que se não for com você e do seu jeito, é melhor que não seja de jeito nenhum. Então, o esperançoso se esconde atrás de uma pergunta tida como ingênua, interessada em saber da minha felicidade, mas, na verdade, desejando que eu não esteja tão feliz assim.
Não sei se expliquei bem. Normalmente, é mais fácil aplicar isso a uma situação real para poder explicá-la do que tentar formular uma teoria abstrata.
O curioso é que tenho observado um crescimento desse tipo de coisa ao meu redor. Ou então, só estou passando a perceber coisas que já aconteciam mas que eu ignorava, não sei.
Só sei que, via de regra, é uma situação bem desagradável e de um ridículo absolutamente perceptível, porque ambas as partes - pessoa que pergunta e pessoa que responde- sabem que a pergunta que o primeiro realmente queria fazer não era essa, e que a resposta que ele gostaria de escutar não é a real, nem nunca vai ser.